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domingo, 18 de novembro de 2012

Breve relato da resistência à Palavra de Deus.


Na História da Redenção os Patriarcas foram os primeiros a transmitir a vontade de Deus aos homens. Como falavam de uma posição privilegiada – eram os chefes de suas famílias – ninguém os questionava, com algumas exceções: José. Que por pouco escapou da morte, mas não de ser vendido como escravo pelos próprios irmãos. Os Patriarcas agiam de modo pessoal e falavam sem rodeios, à família e à amigos, como Jó.
Deixando Moisés de lado, por ser um caso atípico, que merece ser tratado isoladamente, o segundo grupo que aparece nesta linha são os profetas. Quer sigamos a metodologia de Pedro, que fixa Samuel como o primeiro profeta (At 3.24), quer usemos o critério do próprio Samuel e incluamos também os videntes, que já existiam no tempo dos juízes (1Sm 9.9), não há como ver um ministério diferente. Todos eles falavam diretamente e sem rodeios.
Elias e Eliseu, além de não deixarem nada escrito, eram itinerantes. Foi Samuel que conciliou esta necessidade com um endereço fixo (1Sm 7.15-17) e o primeiro a registrar. Todos sofreram perseguições e arriscaram a vida.
Com o crescimento das cidades e especialmente a centralização do culto em Jerusalém, alguns passaram a ser tipicamente urbanos, como Isaías, que vivia na corte, e Jeremias, que morava em Jerusalém apesar de possuir uma propriedade no campo (Jr 37.12). Porém, enquanto alguns moravam em cidades e exerciam algum tipo de trabalho no templo, como Isaías e Habacuque, a maioria morava em vilas e falava diretamente contra o rei, contra as autoridades e contra o povo idólatra. De príncipes como Sofonias (Sf 1.1) a boiadeiros como Amós (Am 7.14-15). Todos foram enviados por Deus “desde a madrugada” (Jr 7.27) e todos foram desprezados. Alguns até mortos (Lc 13.34).
O equivalente aconteceu também no Reino do Norte.
Nem na Babilônia foi diferente. Não conseguiam cantar o “Canto do Senhor em terra estranha” (Sl 137.4), mas ouviram os profetas lá também. Embora Daniel não tenha se dirigido diretamente ao povo, descobriu a que se referia as profecias de Jeremias (Dn 9.2) e profetizou as datas do Messias (Dn 9.24-27). Neemias foi quem falou – e até agrediu – diretamente ao povo (Ne 13.25). Deus animou Ezequiel a falar-lhes na cara dando-lhe rosto de pedra (Ez 3.4-11). E pela primeira vez, na volta do cativeiro – tirando Moisés, como já disse, e as reformas de Ezequias e Josias – o Texto Sagrado fala de multidões em busca da Palavra de Deus.
João Batista viveu em uma época mais urbanizada, entretanto imitou em tantos aspectos a vida de Elias que preferiu os desertos. E novamente o Texto Sagrado fala de multidões. Procurava-o e era conclamada ao arrependimento. Fez incursões nas cidades onde igualmente denunciava o pecado e isso lhe custou a vida.
Jesus iniciou seu ministério no ponto onde João parou: “Ouvindo, porém, Jesus que João fora preso, retirou-se para a Galileia; e, deixando Nazaré, foi morar em Cafarnaum, [...] Daí por diante, passou Jesus a pregar e a dizer: Arrependei-vos, porque está próximo o reino dos céus” (Mt 4.12-17), ou seja: a mesma mensagem de João.
Jesus falou diretamente e em particular. E embora tenha acolhido os pecadores arrependidos, jamais deixou de repreender o pecado nem os pecadores impenitentes. Novamente o Texto Sagrado fala de multidões. Mas quando Jesus percebe que elas têm segundas intenções ele foge delas ou as repreende (Jo 6.26-27). Não preciso dizer que fim ele teve.
A narrativa dos Atos dos Apóstolos nos traz a impressão de que a Igreja era mais “multidão”, embora o relato esteja salpicado de descrições de casas. Os apóstolos confrontavam constantemente o erro e os errados, inclusive com punições físicas, como cegueira (Simão), morte (Ananias e Safira), etc. E não há uma só carta do Novo Testamento que não tenha sido escrita para combater um ou mais erros.
Dois séculos após, já dona do patrimônio pagão, a Igreja se viu com templos enormes; e o que já vinha sendo praticado com certa parcimônia – a imitação das reuniões da sinagoga – passou fazer às claras: a espontaneidade das reuniões nos lares precisou de um ordenamento maior: as liturgias. Quanto maior era o destaque que se dava as mesmas, mais a missão legada desde os profetas – reprovar o erro – era abafada. Exatamente como acontece hoje: “Vamos louvar”. Naqueles dias com cânticos polifônicos, depois gregorianos e finalmente grandes missas de enredos intrincados.
A Reforma Protestante se levantou contra esse tipo de coisas proclamando que a Palavra de Deus deve ter primazia, e, mesmo que não houvesse mais profetas, ainda havia um ministério profético, afinal a Igreja está assentada sobre eles e sobre os apóstolos (Ef 2.20) e a palavra deles devia continuar viva, e, de tal modo exposta e explicada, com o Texto Sagrado nas mãos, que se pudesse dizer como eles diziam “assim diz o Senhor”.
Para que os antigos pudessem ser ouvidos nos grandes edifícios os construtores se valeram de toda sabedoria arquitetônica em favor da acústica. Dosséis passaram a encimar os púlpito e estes, por sua vez, foram colocados o mais alto possível. A Reforma Protestante enfatizou mais ainda e suprimiu do edifício tudo o distraía a atenção de cultuava. Os sermões, antes, quase poéticos – quando existiam – passaram a ser quase preleções ou aulas. Para o protestante, entender a Bíblia era questão de salvar sua alma. Atender ao culto divino era negar-se a si mesmo e ouvir, muitas vezes de pé, a sermões com uma ou duas horas de duração. Não há a menor dúvida que além dos papistas os perseguirem, inclusive com fogueiras, foram mal entendidos e vistos como fanáticos. Mas nos legaram uma herança de temor a Deus.
Spurgeon, que viveu na segunda metade dos anos 1800, reclamava da teatralização das Igrejas inglesas. No texto clássico “Apascentando ovelhas ou entretendo bodes” ele pergunta qual é a verdadeira missão do servo de Deus: Proclamar a vontade do Altíssimo ou promover momentos agradáveis a seu rebanho e aos eventuais visitantes? Foi desprezado até por seus colegas pastores batistas das Igrejas de Londres.
Um pecador que hoje se aproxima de um púlpito deve ser inquietado por sua vida pecaminosa. Um filho de Deus aflito deve ser consolado pela graça de nosso Senhor. Mas nunca nos enganemos, tais necessidades só podem ser supridas pelas Escrituras. Mas como sempre houve, sempre haverá resistência: “prega a palavra, insiste a tempo e fora de tempo, aconselha, repreende e exorta com toda paciência e ensino. Porque chegará o tempo em que não suportarão a sã doutrina; mas, desejando muito ouvir coisas agradáveis, ajuntarão para si mestres segundo seus próprios desejos; e não só desviarão os ouvidos da verdade, mas se voltarão para as fábulas” (2Tm 4.2-4 Almeida XXI).

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