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quinta-feira, 27 de setembro de 2012

A Fé: uma Doutrina Incompreendida



- A. W. Tozer

No esquema divino da salvação, a doutrina da fé é essencial. Deus dirige suas palavras à fé, e onde não existe fé, é impossível uma verdadeira revelação. "Sem fé é impossível agradar a Deus."

Cada um dos benefícios derivados da expiação de Cristo chega ao indivíduo pela porta da fé. Perdão, purificação, regeneração, o Espírito Santo, todas as respostas à oração, são concedidas à fé e recebidas pela fé. Não existe outro meio. Esta é uma doutrina evangélica comum e aceita onde quer que a cruz de Cristo é compreendida. Pelo fato de a fé ser tão vital a todas as nossas expectativas, tão necessária ao cumprimento de cada uma das aspirações de nosso coração, não ousamos tomar nada como certo em relação a ela. Uma coisa que abrange tanto bem e tanto mal, que na verdade decide nosso céu e nosso inferno, é demasiado importante para ser negligenciada. Não nos é possível de modo algum manter-nos não-informados ou mal-informados. É preciso saber.

Meu coração se manteve durante muitos anos preocupado com a doutrina da fé, como ela é recebida e ensinada entre os cristãos evangélicos por toda parte. Grande ênfase é dada à fé nos círculos ortodoxos, e isso é bom; mas continuo preocupado. Meu temor específico se prende ao fato de o moderno conceito de fé não ser bíblico. Quando os professores de hoje usam a palavra, eles não têm em mente o mesmo significado que os escritores bíblicos lhe deram, segundo penso.

As causas de minha preocupação são as seguintes: 
1. A falta de um fruto espiritual na vida de tantos que afirmam ter fé. 
2. A raridade de uma transformação radical na conduta e perspectiva geral das pessoas que professam sua nova fé em Cristo como seu Salvador pessoal. 
3. O fracasso de nossos professores em definir ou mesmo descrever aquilo a que a palavra fé deveria referir-se. 
4. O fracasso completo de multidões de interessados, por mais sinceros que sejam, de tirar qualquer proveito da doutrina ou receber através dela qualquer experiência satisfatória. 
5. O perigo real de que uma doutrina tão servilmente imitada e recebida sem críticas por tantos seja tão falsa quanto a compreensão que têm da mesma. 
6. Tenho visto fé sendo apresentada como um substituto à obediência, uma fuga da realidade, um refúgio da exigência de raciocinar, um esconderijo para um caráter fraco. Conheci pessoas que davam o nome de fé aos espíritos de animais superiores, ao otimismo natural, às emoções e a tiques nervosos. 
7. O bom senso comum deveria dizer-nos que qualquer coisa que não transforme a pessoa que a professa, também não faz diferença para Deus. Não podemos deixar de observar que para um número incontável de pessoas a mudança da falta de fé para a fé não faz uma diferença real na vida delas.

Talvez seja útil saber primeiro o que a fé não é. a fim de podermos entender aquilo que ela é. Não é acreditar numa declaração que sabemos ser verdadeira. A mente humana foi feita de tal forma que acredita necessariamente quando a evidencia a ela apresentada é convincente. Não pode agir de outro modo. Quando a evidência não consegue convencer, a fé é impossível. Nenhuma ameaça ou castigo consegue obrigar a mente a crer quando existe evidência clara em contrário.

A fé baseada na razão é um tipo de fé, mas não se trata do caráter da fé bíblica, pois segue infalivelmente a evidência e não possui uma natureza moral ou espiritual. A ausência de fé baseada na razão também não pode servir para condenar ninguém, pois a evidência e não o indivíduo é quem decide o veredicto. Enviar um homem para o inferno pelo único fato de seguir a evidência até a sua conclusão adequada seria demasiada injustiça; justificar um pecador dizendo que ele tomou suas decisões segundo fatos claros seria fazer da salvação o resultado das operações de uma lei comum da mente, aplicável tanto a Judas como a Paulo. Seria tirar a salvação da esfera da vontade e colocá-la num plano mental, onde, segundo as Escrituras, ela certamente não se enquadra.

A verdadeira fé se apóia no caráter de Deus e não pede outras provas além das perfeições morais d'Aquele que não pode mentir. Basta que Deus tenha afirmado, e se a declaração for contrária a cada um dos cinco sentidos e a todas as conclusões da lógica, o crente mesmo assim continua crendo. "Seja Deus verdadeiro e mentiroso todo homem" (Rm 3:4), é a linguagem da fé real. O céu aprova tal tipo de fé porque ela se eleva sobre as simples provas e se apóia no seio de Deus.

Em anos recentes tem havido um movimento entre certos evangélicos no sentido de provar as verdades bíblicas apelando para a ciência. É buscada evidência no mundo natural, a fim de apoiar a revelação supranatural. Flocos de neve, sangue, pedras, criaturas marinhas estranhas, pássaros e muitos outros objetos naturais têm sido apresentados como prova de que a Bíblia diz a verdade. Isto tem sido considerado como um grande aliado da fé, afirmando que se uma doutrina bíblica puder ser provada como verdadeira, a fé irá brotai e florescer em resultado disso.

O que esses irmãos não percebem é que o próprio fato de eles sentirem a necessidade de buscar provas para as verdades das Escrituras traz à luz algo completamente diverso, a saber, sua própria descrença básica. Quando Deus fala, a incredulidade pergunta: "Como posso saber se isso é verdade?" EU SOU O QUE SOU é a única base para a fé. Escavar entre as rochas ou pesquisar as profundezas dos mares a fim de conseguir evidência para apoiar as Escrituras é insultar QUEM as escreveu. Acredito sinceramente que isto não é feito intencionalmente, mas não vejo como escapar à conclusão de que de todo modo isso acontece.

A fé, como apresentada na Bíblia, é confiança em Deus e em seu Filho Jesus Cristo. É a resposta da alma ao caráter divino, como revelado nas Escrituras, e mesmo esta resposta é impossível sem a operação do Espírito Santo. A fé é um dom de Deus à alma arrependida e nada tem a ver com os sentidos ou à informação por eles prestada. A fé é um milagre; é a capacidade dada por Deus para que confiemos em seu Filho, e qualquer coisa que não resulte em ação segundo a vontade de Deus não é fé, mas algo inferior a ela.

A fé e a moral são dois lados da mesma moeda. A moral é de fato a própria essência da fé. Qualquer fé em Cristo como Salvador pessoal que não submeta a vida da pessoa à obediência completa a Cristo é insuficiente e irá trair sua vítima no final. O homem que crê obedecerá; a falha em obedecer é uma prova convincente de que não existe verdadeira fé. A fim de tentar o impossível Deus deve conceder fé, caso contrário ela não existirá, e Ele só concede fé ao coração obediente. Há obediência quando há arrependimento; pois este não é apenas tristeza pelos erros e pecados do passado, mas também uma decisão de começar a fazer desde agora a vontade de Deus como revelada por Ele a nós.


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